segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

FAZ CESÁRIA: É TRANQUILO, VOCÊ NÃO SENTE NADA.


Quantas vezes você já não ouviu isso por aí? 

Mas o que há por detrás deste conselho aparentemente inocente e gentil?

Convido você a parar por um instante e tentar analisar a problemática deste discurso.

Leia de novo: “Faz cesárea, é tranqüilo, você não vai sentir nada.”

Percebeu onde está o problema?

Não?

O problema está justamente na escolha de não sentir nada.

Por que alguém opta por passar por uma das experiências mais transformadoras da vida, sem sentir nada?

Por que insistimos em nos privar de nossas sensações, nossas emoções, nossos sentimentos?

Seja nos justificando ou nos escondendo atrás de um medo (ou vários deles), optamos por nos deixar anestesiar e seguimos a vida “sem sentir nada”. Ou sentindo quase nada, ou sentindo muito pouco.

É por essas e por outras que a humanidade está perdendo a sua capacidade de sentir. Estamos perdendo a capacidade de nos sensibilizar diante da vida. Estamos evitando cada vez mais viver os nossos sentimentos, nossas emoções. Estamos evitando as sensações.

Por medo de nos entregar à vida, estamos nos entregando - sem que a gente perceba - cada vez mais ao uso de drogas lícitas e ilícitas, que nos torporizam e, supostamente, nos ajudam a viver melhor.

Se encarássemos nossos medos de frente e mergulhássemos de cabeça - abertos e conscientes - em todas as experiências de nossas vidas, acredito que nos tornaríamos seres humanos mais sensíveis, mais bem preparados e bem melhores no trato consigo mesmo e conseqüentemente com os outros.

O que vamos sentir? O que vamos aprender? Só vivendo (de verdade) para saber.

Claudia A. Xavier
Mãe da Olívia nascida de Parto Domiciliar 
É Terapeuta de Orientação Transpessoal e Desenvolve Programas de Gestação Consciente e Preparação para o Parto 

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

UMA CRÔNICA SOBRE TER NENÉM, PARIR E DAR À LUZ


Esta é uma estória de três mulheres que acabam de atravessar o portal para a Maternidade e um pouco de suas experiências.

Ana teve neném mês passado.
Joana acabou de parir.
Maria deu à luz na quarta-feira.

Ana teve neném no dia 20/11/2011 às 11:00 horas.
Joana pariu no hospital perto de sua casa.
Maria deu à luz acompanhada do seu marido.

Ana estava ansiosa pela chegada do seu primeiro filho.
Joana também.
Maria estava ansiosa pela chegada do seu primeiro filho e para, só então, descobrir qual era o sexo do bebê.

Ana passou sua gravidez desejando um parto normal e planejando o enxoval, a decoração do quarto, o chá de fraldas e as lembrancinhas da maternidade.
Joana passou sua gravidez querendo um parto normal.
Maria passou sua gravidez buscando, pesquisando, lendo, freqüentando grupos, vivências, terapia e se preparando física e emocionalmente para o parto normal.

Ana trabalhou até o dia anterior ao nascimento de seu filho.
O último dia de trabalho de Joana foi o dia que seu filho nasceu.
Maria parou de trabalhar uma semana antes da data prevista de parto.

Ana fazia o pré-natal com o ginecologista, super querido, que a acompanhava desde a adolescência e até fazia parto normal.
Joana fez seis consultas de pré-natal.
Maria mudou cinco vezes de médico durante a gravidez até encontrar aquele com o qual teve plena certeza que teria seu parto normal.

Ana teve seu bebê com 39 semanas de gestação porque na última consulta ao ginecologista foi informada, pela secretária, que na semana seguinte ele iria viajar.
Joana pariu seu bebê com 40 semanas de gestação, após a bolsa ter rompido, assim que ela chegou em casa voltando do trabalho.
Maria deu à luz ao seu filho pouco depois de completar a 41ª. semana de gestação, após ter passado por 16 horas de trabalho de parto.

Ana chegou no dia marcado à maternidade mais famosa da cidade. Fez sua admissão, foi apresentada às dezenas de serviços oferecidos, contratou a filmagem, a transmissão ao vivo da cirurgia e levou de brinde uma foto do seu bebê publicada na galeria do site do hospital.
Joana chegou ao hospital mais próximo de sua casa, com contrações regulares, foi internada e logo veio uma enfermeira lhe fazer o exame de toque. Estava com cinco centímetros de dilatação. De hora em hora vinham checar o quanto ela já havia dilatado.
Maria chegou ao hospital com contrações regulares, acompanhada de seu marido e sua doula e logo em seguida seu obstetra chegou. Maria permaneceu intocada.

Ana teve de se despir e, deitada na maca, foi levada para a sala de cirurgia. Naquela sala fria e com luzes fortes, tomou anestesia. Segurava firme na mão do seu marido quando o procedimento começou.
Joana foi levada para a sala de parto, deitada na maca em posição ginecológica, tomou soro com ocitocina porque não dilatava. Não deixaram seu marido a acompanhar.
Maria entrou na sala de parto e enquanto sua doula enchia a banheira, ela dançava com seu marido ao som do CD que havia levado para ouvir durante seu trabalho de parto. Seu obstetra apenas observava.

Ana não conseguia ver e nem sentir nada do que estava acontecendo com seu corpo.
Joana era exigida a fazer uma força que não tinha vontade de fazer.
Maria mergulhava dentro de si.

Ana viu quando aquelas mãos com luvas e aquele rosto coberto por uma máscara levantaram o corpinho de seu filho. Viu seu rostinho de perto quando a enfermeira encostou rapidamente as bochechinhas dele nas suas.
Joana tomou uma baita anestesia porque berrava de dor após a indução. Levou ainda uma episiotomia para o bebê sair mais rápido. Da posição em que estava, não viu e nem sentiu o seu filho nascer.
Maria tomada pelas contrações fazia sons estranhos, como se fossem cantos misturados com gemidos. Sentiu vontade de tocar seu bebê e pôde sentir a cabecinha dele ainda dentro dela. Quando teve vontade, fez a força necessária para seu filho nascer. Sentiu o corpo de seu filho atravessar-lhe o ventre. Pegou-o em seus braços e aconchegou-o em seu peito.

Ana teve Antônio.
Joana pariu João.
Maria deu à Luz ao Gabriel.

Ana é a melhor mãe do mundo para seu filho.
Joana também.
E Maria, idem.

Claudia A. Xavier
Mãe da Olívia nascida de Parto Domiciliar na Água 
É Terapeuta de Orientação Transpessoal e 
Desenvolve Programas de Gestação Consciente e Preparação para o Parto 

domingo, 15 de janeiro de 2012

PAREI DE AMAMENTAR E NÃO DEIXEI DE AMAR.


Muitas vezes, me pego assustada com o imenso poder que as imagens coletivas exercem em nós.

Quando engravidei, eu acreditava que depois que minha filha nascesse eu iria sentir o maior prazer do mundo ao amamentá-la.

Eu acreditava que a cada mamada eu sentaria placidamente, no lugar que fosse, colocaria o seio para fora e teria aquele bebê lindo, sendo nutrido pelo meu ser.

Afinal, não é assim que o aleitamento materno é vendido nas propagandas e na ficção? Aquelas mulheres lindas e sorridentes, amamentando serenamente aqueles bebês calmos e rechonchudos?

Infelizmente, comigo e com uma boa parcela das mulheres, amamentar não foi esse “comercial de margarina”.

Amamentar para mim foi muito, muito difícil. Muitos fatores contribuíram para esta dificuldade.

De início a pega incorreta da minha filha fissurou os meus dois mamilos que, rachados, sangraram por uns 10 dias. Acertada a pega, e depois de cicatrizadas as fissuras, eu achei que tudo ficaria bem.

Para minha desilusão, logo depois, eu contraí uma candidíase mamária que fazia com que a cada término de mamada eu sentisse coceiras incontroláveis nos seios e fagulhadas profundas nos mamilos.

Foi uma candidíase extremamente insistente que, mesmo após eu ter tomado todos os remédios terminados com “zol” do mercado, ter usado corticóide, ministrado violeta genciana na minha filha e em mim, feito até reza braba, não houve melhora significativa. Ela ia e voltava com recorrência.

Pra completar o cenário, por quatro vezes ao longo de seis meses eu fui parar de madrugada no pronto socorro com cólicas renais. Pedrinhas nos rins básicas pra completar o pacote.

Mesmo diante disso tudo, eu insisti na amamentação.

Durante as mamadas, minha filha também chorava bastante. Ela mamava um pouquinho e chorava, mamava outro pouquinho e chorava. Pra mim era muito difícil lidar com este choro. O que eu estava fazendo de errado? O que ela estava sentindo?

No final do segundo mês ela foi diagnosticada com refluxo. Segundo o pediatra era por isso que ela chorava durante as mamadas. Fizemos o tratamento e realmente, lá pelo início do quinto mês ela já não chorava mais ao mamar.

Entretanto, minha candidíase continuava lá, e o que era pior, havia se alastrado para o corpo todo. Havia se tornado sistêmica, por mais que eu ainda estivesse tratando. Numa das consultas ao mastologista acho que o médico até sentiu pena de mim.

Ainda havia um componente psíquico-emocional para o qual eu não estava preparada. Eu não conseguia ficar tranqüila, calma e serena amamentando. Eu não estava conectada a esta ação.

Acredito inclusive que a maioria das mulheres não está. Atualmente as mulheres têm a sua dimensão masculina muito mais desenvolvida do que a feminina. Elas trabalham, produzem, criam, competem, conquistam. Principalmente aquelas que estão dentro do mundo corporativo. Isso faz com que a dimensão feminina, responsável pela entrega, abertura, cooperação, aceitação, doação e nutrição fique atrofiada.

No meu caso, eu não sei se por todo o contexto relatado ou se pelo fato de eu estar mesmo dissociada deste aspecto eu não conseguia fazer esta conexão. Quantas e quantas vezes eu não amamentei sentada na frente do computador ou lendo um livro porque “eu precisava fazer alguma coisa”?

Só quando a minha filha completou cinco meses que a minha ficha caiu ao ponto de eu perceber que esse tipo de amamentação não era efetiva. Nem para mim, nem para ela. Ela era nutrida sim, de alimento, exclusivamente. Porém, onde estava a minha presença? No computador, no livro, na reforma da minha casa?

Não sei se todo o quadro sintomático foi por causa desta minha desconexão ou se minha desconexão foi reflexo de todo o quadro pelo qual eu passei. O segredo de Tostines ainda paira no ar, apesar de eu ter uma boa intuição do que veio primeiro.

Acontece que, quando minha filha completou quatro meses, eu tive que voltar a trabalhar e tinha que fazer a ordenha para dar a ela. Pouco tempo depois minha produção de leite caiu bastante e, insistindo na amamentação eu passei a tomar uma medicação para aumentar a produção.

Mas eu já estava cansada. Bastante cansada. E vinha me questionando se deveria continuar.

Deveria? Por quê? Por que a Organização* recomendou? Por que eu tive um parto “natureba” (como dizem por aí) e então deveria que seguir essa linha? Por que as amigas amamentaram por muito mais tempo?

Não, eu não queria mais prosseguir. Para mim estava sendo muito difícil e exaustivo e eu não conseguia conciliar todas as coisas.

Para mim era um alívio quando eu dava uma mamadeira para minha filha e não tinha que sentir coceira, nem dores. Melhor ainda quando era o pai dela quem dava e eu podia apenas admirar aquela cena linda, dele com ela no colo e ela olhando fixamente para ele. Ou então eu podia apenas me dar ao pequeno luxo de  ir dormir mais cedo.

E então, eu tomei a decisão de parar de amamentá-la quando ela completasse os seis meses de vida. Antes de ela completar, eu já conversava com ela e explicava tudo o que eu estava sentindo e contava a ela sobre minha decisão. Pedia para que ela entendesse e dizia que ela estaria experimentando outros sabores da vida.

Quando ela completou seis meses eu ainda continuava a amamentar mais espaçadamente, é claro, mas ainda assim oferecia o seio para ela. Alguns dias passados, quando eu oferecia, ela já não pegava mais.

Parei de amamentar de forma consciente, através de uma escolha estudada e bem elaborada internamente. Sem culpa, sem remorso. Parei de amamentar, pois sei que nunca deixarei de amar.

*OMS (Organização Mundial da Saúde)



Claudia A. Xavier
Mãe da Olívia nascida de Parto Domiciliar na Água 
É Terapeuta de Orientação Transpessoal e 
Desenvolve o Programas de Gestação Consciente e Preparação para o Parto 

É PRECISO SAIR PARA SE ENCONTRAR


Dia desses, ouvi uma "mãe-recente" discursando a respeito dos motivos pelos quais ela deixaria de ir ao show de um dos seus cantores favoritos.

O motivo apontado me pareceu muito nobre e bastante coerente num primeiro momento. Ela dizia que não iria ao show do cantor, pois acreditava que não era necessário deixar seu bebê com outra pessoa, para curtir o espetáculo, pois este momento que ela estava vivendo era de dedicação exclusiva a ele (ao bebê).

Até aí, compreendi a decisão e achei bastante coerente a fala e atitude desta puérpera. Afinal, eu também abri e ainda abro mão de muitos eventos sociais depois que minha filha nasceu e faria tudo novamente.

Entretanto, o que me chamou atenção nesta estória foi que, pouco tempo depois descobri que o bebê tinha na ocasião cinco meses e o referido show, do seu cantor favorito, aconteceria dali há três.

Ou seja, quando o show tiver ocorrido, o bebê estará com oito meses de idade. E, obviamente, um bebê com oito meses de idade não é o mesmo bebê de cinco meses. Já terá sido introduzido à alimentação complementar, já estará mais maduro, talvez até engatinhando, quem sabe até andando? Estará descobrindo mais e mais o mundo e apropriando-se de sua independência. Afinal este é o caminho que os filhos percorrem (ou deveriam percorrer).

Em três meses, as necessidades dele serão outras e as necessidades desta mãe também.

Ao tomar esta decisão "prematura", sobre ir ou não ao show, acredito que esta mãe não levou em consideração os fatores apontados. Mas, tudo bem, isso é altamente perdoável, porque durante o puerpério a mulher fica fusionada ao seu bebê, vivendo uma espécie de simbiose, o que a dificulta e muito a tomada de decisões, principalmente as de longo prazo.

Porém, o estranhamento maior que observei nessa estória, foi que esta mãe terminava seu discurso sobre a escolha de não ir ao show, que aconteceria dali 03 meses, para se dedicar exclusivamente ao seu bebê hoje com cinco meses, em razão de toda necessidade que um bebê nesta idade tem, usando as seguintes palavras: 

“Quando for a hora eu volto a ter a minha vida.”

Alto lá! Como assim quando for a hora volto a ter a minha vida?

Essa é sua vida! Sua vida de mãe, de mulher, de esposa, de filha, de amiga, profissional, enfim, são todos esses os papéis que precisamos desempenhar. E desempenhá-los saudavelmente.

Percebo que hoje existe um movimento importante das mulheres que estão optando por não trabalharem fora para cuidar e educar seus os filhos – e afirmo com todas as letras que, se minha condição permitisse eu faria o mesmo – mas, existem milhares de outros papéis que precisamos desempenhar.

Inclusive, um dos grandes aprendizados desta vida é a conciliação destes papéis.

Diante desta história fico me perguntando quantas e quantas mães não se permitem viver momentos de prazer, sozinhas, com seus maridos, sem os seus bebês porque estão enclausuradas num modelo predefinido de maternidade. Porque podem ser vista pelos outros como mãe desnaturada. Ou talvez haja um temor escondido de que seu bebê "deixe de amá-la" por este “abandono”. Ou talvez por haver uma culpa latente.

Não sei se é este o caso específico, porém, fez-me pensar em quantas mães vivem aprisionadas dentro de sua maternidade vivendo orientações, recomendações, julgamentos de todo o mundo, menos de si mesma.

Acredito ser importante e saudável para a relação mãe-bebê que a mãe tenha seus momentos exclusivos com o bebê, assim como é importante para o bebê relacionar-se com outras pessoas que não os pais. É importante e saudável que a mãe permita-se cuidar de si mesma, de seu corpo, de sua mente, de sua alma, pois cuidar de si mesma também é cuidar do seu bebê.  

A melhor analogia que conheço para apoiar minha opinião sobre este assunto vem do procedimento de segurança dos aviões: “Máscaras cairão sobre suas cabeças, coloque-as primeiro em você e depois nas crianças ao seu lado.”

É bastante óbvio que primeiro precisamos estar bem com nós mesmas para podermos promover o bem-estar a quem quer que seja, principalmente, o bem-estar de nossos filhos.

Afinal, não é disso que nossos bebês precisam? De mães e pais felizes? Autenticamente felizes?



Claudia A. Xavier
Mãe da Olívia nascida de Parto Domiciliar na Água 
É Terapeuta de Orientação Transpessoal e 
Desenvolve Programas de Gestação Consciente e Preparação para o Parto